A Teoria da Evolução, formulada por Charles Darwin (e Alfred
Wallace) não é mais só uma teoria. E já faz tempo. Evolução sempre foi minha disciplina favorita da Biologia. É uma grande história, complexa e bonita. Depois
que eu comecei a trabalhar com evolução eu vi a dificuldade de contar essa
história. Eu admito que acho uma área da ciência mega difícil porque é
multidisciplinar, é confuso, nem sempre temos todas as peças para montar uma
história bonita, mas ainda assim é uma disciplina encantadora.
A evolução normalmente não é uma coisa palpável e não
acontece num lapso de tempo que podemos presenciar. Normalmente é algo que
podemos somente imaginar e “ver” através de dados coletados de fósseis, dados
genéticos, geologia, biogeografia, etc. Nem todo mundo tem esse poder de
abstração e, talvez por isso, nem todo mundo ache que evolução seja uma coisa
real. Percebam que eu escrevi “normalmente” porque isso está prestes a mudar.
Já não é de hoje que cientistas tentam provar a teoria da
evolução através de organismos que evoluem rapidamente, como vírus e bactérias.
Hoje já podemos ver os resultados (não somente dados coletados) em questão de
anos, poucos anos.
O estudo mais recente sobre esse assunto é de autoria de
Justin Meyer e colaboradores e será publicado essa semana no periódico Science.
Eles estudaram o processo de especiação no bacteriófago lambda (um vírus que
infecta bactérias – inofensivo ao ser humano) que possui gerações rápidas e
alta taxa de recombinação. Eles fizeram uma série de experimentos infectando cepas
de E. coli que possuíam dois tipos
diferentes de receptores para bacteriófagos lambda. Quando a cepa de E. coli possuía somente um tipo de
receptor, o vírus melhorava sua ligação com esse receptor ao mesmo tempo que
perdia a habilidade de ligar no outro receptor. Já quando o vírus era posto com
bacteriófagos com ambos tipos de receptores, ele separava em duas linhagens com
diferentes preferências de receptor. Algumas linhagens desenvolveram até
isolamento reprodutivo e incompatibilidades genéticas.
Outro estudo, do pesquisador Marcus Kronforst e
colaboradores, estudou especiação em borboletas do gênero Heliconius. O mais
interessante desse artigo foi a descoberta que poucas mudanças genômicas já são
suficientes para a formação de uma nova espécie, mesmo quando há fluxo gênico
(essas borboletas são conhecidas por formarem muitos híbridos). No caso das
borboletas, algumas mudanças no padrão de coloração das asas (muito importantes
para evitar a predação e para o acasalamento) já eram suficientes para o
surgimento de uma nova espécie. Além disso, o artigo também conclui que as
divergências evoluem rapidamente após as primeiras mudanças sugerindo que não
existe uma relação linear entre tempo de especiação e divergências acumuladas.
Outro estudo que mostra rápida
especiação (dessa vez em vertebrados) é um estudo conduzido pelo pesquisador David
Marques e colaboradores. Eles avaliaram populações de um peixe (Gasterosteus
aculeatus) residentes em lagos migratórios e vivem em simpatria e parapatria
(dois tipos de especiação sem barreira). Eles examinaram diferentes ecotipos de
peixes nos diferentes lagos e identificaram diferenças genômicas mesmo com
populações que estão em contato umas com as outras. Essas divergências evolutivas
provavelmente se dão por pressões diferentes em cada habitats. Eles concluem
que essas adaptações ao ambiente se dão logo nos primeiros anos de divergência
de habitat (no caso dessas lagoas foram 150 anos até agora) e podem persistir
mesmo com os indivíduos vivendo em simpatria (em que as populações mantém
contato uma com a outra). Esse foi o primeiro caso que se conseguiu verificar o
início de uma provável especiação simpátrica e parapátrica. A maioria dos
autores trabalham com especiação alopátrica que é aquela em que existe uma
barreira (geográfica ou ambiental) separando as populações.
Diante de tudo isso, não há como negar a existência
da evolução e, se me permitem, não há como não concordar que ela é linda.
No Brasil, há diversos laboratórios que trabalham
com evolução de espécies, coletando dados moleculares, morfológicos,
geológicos, etc. Há uma série de ramos para se trabalhar: filogeografia,
filogenia, biogeografia e mais uma série de ramificações em cada um desses.
Difícil mesmo é escolher. Não vou citar todos laboratórios e universidades que
trabalham com esse tema, mas vou deixar nas referências os dois que eu
trabalhei e conheço (ambos no RS).
Quem tiver mais interesse é só dar uma espiada no
departamento de biologia da universidade mais próxima que provavelmente vai
encontrar alguma coisa.
Referências: