quinta-feira, 2 de março de 2017

Alternativa aos opióides

Opióides são substâncias derivadas do ópio e utilizadas (na medicina) para o tratamento de dor crônica. O opióide mais conhecido é a morfina e é dela que deriva a droga opióide mais utilizada, a heroína. O ópio é utilizado desde o período neolítico como calmante, sonífero, veneno ou para fins recreativos. Há diversas menções ao seu uso e suas funções em civilizações remotas e até na bíblia. Somente no século II dC é que o ópio começou a ser utilizado no tratamento da dor e que tomou-se conhecimento das consequências do abuso dessa substância. Atualmente, derivados do ópio (naturais e sintéticos) são muito utilizados no tratamento de dor pós cirúrgica, dor crônica, câncer, etc. O problema começa quando, além de não ser 100% eficiente, alguns pacientes desenvolvem tolerância, alergia ou dependência dessa droga. Mesmo em pacientes que não apresentam nenhum desses problemas, a droga pode trazer efeitos colaterais bem sérios.
Papaver somniferum - ópio é extraído dos frutos imaturos.

Um estudo de 2012 (1) mostrou que pacientes que receberam altas doses de opiáceos para tratamento de dores nas costas foram os que mais utilizaram os serviços de emergência médica. Além disso, eles tinham maior número de prescrições, o que poderia indicar a não resolução do problema com opiáceos. Já outro trabalho de 2016 (2), mostra o uso prolongado de opióides até 6 meses após cirurgias de joelho e quadril mesmo depois da melhora da dor. Segundo a autora, o fator mais decisivo para continuação do uso era o uso pré-operatório de morfina. Até 80% dos pacientes que já tomavam morfina antes da cirurgia continuaram tomando mesmo após a recuperação, mostrando uma possível dependência da droga.
Em 2015, um estudo mostrou que era possível manejar a dependência de opióides e, assim, prevenir que pacientes continuem aumentando mais e mais as doses (3). Nesse estudo, eles descobriram uma proteína (CXCL 1) que é responsável pela tolerância a opioídes. Tanto em humanos, quanto em ratos, essa proteína era mais expressa quanto maior a dose de opióide administrada. Após essa fase, os autores conseguiram bloquear a expressão dessa proteína em ratos e verificaram que a eficácia do opióide se manteve mesmo após altas doses e tratamentos prolongados.
Já em 2017, foi publicado um estudo na PNAS onde foi isolada uma substância tão eficaz quanto opióides para o tratamento da dor e que utiliza uma via diferente deste (4). A substância em questão é uma molécula, utilizada como veneno, produzida por um pequeno gastrópode que vive no mar do Caribe (Conus regius). O composto, chamado Rg1A, é capaz de neutralizar a dor utilizando uma via de sinalização diferente da dos opióides. Além disso, o efeito é tão duradouro que mesmo depois da substância ser excretada do corpo, ela continua fazendo efeito por até 72 horas, sugerindo que o composto tenha um efeito restaurativo em alguns componentes do sistema nervoso. A esperança dos autores é que essa substância possa ser utilizada em pessoas tolerantes, alérgicas ou que por alguma razão não possam utilizar opióides. Poucas são as drogas conhecidas que trabalham por uma via de sinalização diferente dos opióides e a maioria delas não é muito efetiva. A próxima fase de estudos será realizar testes clínicos para determinar a efetividade e segurança dessa substância.

1.       Amy M. Kobus, David H. Smith, Benjamin J. Morasco, Eric S. Johnson, Xiuhai Yang, Amanda F. Petrik, Richard A. Deyo. Correlates of Higher-Dose Opioid Medication Use for Low Back Pain in Primary CareThe Journal of Pain, 2012; 13 (11): 1131 DOI: 10.1016/j.jpain.2012.09.003.
2.       Jenna Goesling, Stephanie E. Moser, Bilal Zaidi, Afton L. Hassett, Paul Hilliard, Brian Hallstrom, Daniel J. Clauw, Chad M. Brummett. Trends and predictors of opioid use after total knee and total hip arthroplasty. PAIN, 2016; 157 (6): 1259.
3.       Chih-Peng Lin, Kai-Hsiang Kang, Tzu-Hung Lin, Ming-Yueh Wu, Houng-Chi Liou, Woei-Jer Chuang, Wei-Zen Sun, Wen-Mei Fu. Role of Spinal CXCL1 (GROα) in Opioid Tolerance. Anesthesiology, 2014; 1 DOI: 10.1097/ALN.0000000000000523.

4.       Haylie K. Romero et al. Inhibition of α9α10 nicotinic acetylcholine receptors prevents chemotherapy-induced neuropathic pain. PNAS, February 2017 DOI: 10.1073/pnas.1621433114