quarta-feira, 19 de julho de 2017

Até quando?

No início desse mês aconteceu a 41º reunião anual do Comitê do Patrimônio Mundial (World Heritage Committee). O comitê foi formado em 1972 em uma conferência da UNESCO, tem 21 países representantes que fazem parte do comitê por quatro ou seis anos cada. A função do comitê é implementar a Convenção do Patrimônio Mundial, definir aonde serão usados os recursos destinados à conservação dos Patrimônios Mundiais e dar assistência financeira mediante solicitações dos países componentes.
O que pode ser considerado Patrimônio Mundial?
A UNESCO considera dois tipos principais de patrimônio mundial:
-Patrimônio Mundial Cultural – São monumentos, grupos de construções ou lugares criados pelo homem e pela natureza (como sítios arqueológicos) de grande valor universal do ponto de vista histórico, científico ou antropológico. Como exemplos de patrimônios mundiais culturais temos, aqui no Brasil, o Plano Piloto de Brasília, as Missões Jesuíticas Guarani, Centro Histórico de Olinda e a Cidade Histórica de Ouro Preto, entre outros.
-Patrimônio Mundial Natural – São formações naturais (biológicas ou físicas) de grande valor universal do ponto de vista científico ou estético. Também podem ser formações geológicas que delimitam áreas ou constituem habitats de espécies ameaçadas de grande valor do ponto de vista científico ou de conservação. Aqui no Brasil, são patrimônios naturais o Parque Nacional do Iguaçu, Reservas da Mata Atlântica, Parque Nacional do Pantanal Matogrossense, a ilha de Fernando de Noronha, entre outros.
Porque dar o título de Patrimônio Mundial?
Segundo a conferência da UNESCO que criou esse título e o comitê, Patrimônios Naturais e Culturais vivem sob ameaça de destruição intencional ou não através das mãos dos homens e também do desgaste causado pelo tempo. Ainda nessa mesma conferência, o desaparecimento de algum desses patrimônios seria uma enorme perda para todas as nações. Por conta disso, a UNESCO criou o comitê que coordena os fundos para preservação e proteção desses patrimônios.
Em teoria, um Patrimônio Mundial teria seu valor reconhecido e estaria protegido do desaparecimento. Em teoria! Vamos voltar à reunião do comitê que aconteceu esse ano. A IUCN (International Union for Conservation of Nature) revelou que dois terços dos 57 Patrimônios Naturais estão sob ameaça por conta da pesca e caça ilegais e exploração de madeira. Duas dessas áreas foram recomendadas, pela IUCN, para adentrar na lista de Patrimônios Naturais em perigo: As ilhas do México e as Áreas Protegidas doGolfo da Califórnia. Esses dois locais fazem parte do habitat da vaquita. A vaquita é a menor espécie de golfinho e se encontra em perigo de extinção iminente por conta da pesca ilegal praticada no seu habitat natural. Atualmente só existem 30 vaquitas em habitat natural. Trinta! A pesca tem por objetivo uma espécie de peixe do gênero Totoaba, também ameaçado de extinção, que possui um alto valor no mercado chinês. Ambas espécies são endêmicas dessa região, ou seja, não são encontradas naturalmente em outros lugares. Listar essas regiões como Patrimônios Naturais em perigo é o último esforço para mobilizar ações urgentes de proteção e combate a atividades ilegais. 
Figura 1: Vaquita, a menor espécie de golfinho está criticamente ameaçada de extinção pela pesca ilegal.
Outros dois Patrimônios também foram citados pela IUCN durante a reunião: As Florestas Tropicais de Madagascar de Atsinanana (já listada nos Patrimônios Naturais em perigo) e a Floresta de Białowieża situada entre a Polônia e Belarus.
As Florestas de Atsinanana compreendem seis parques nacionais distribuídos por Madagascar e são de extrema importância para a manutenção dos processos ecológicos necessários para a sobrevivência da biodiversidade única de Madagascar. Por ser uma ilha separada a muito tempo do continente, a biodiversidade de Madagascar é única e rara. De 80 a 90% dos grupos de animais e plantas existentes ali são endêmicos. A floresta sofre há tempos com a exploração de madeira e a caça de lêmures. A recomendação da IUCN é que essas Florestas permaneçam na lista de patrimônios ameaçados e que haja uma cooperação internacional para lidar com as ameaças.
A Floresta de Białowieża ingressou na lista de Patrimônio Mundial em 1979 e graças aos esforços de proteção, tem se mantido, em grande parte, em seu estado natural. Estima-se que algumas das suas árvores tenham 400 anos de idade. Além disso, é um dos poucos lugares da Europa que abrigam bisões selvagens. Segundo a IUCN, a exploração de madeiras de crescimento lento, como carvalhos, está impactando severamente a floresta.
E o que não faz parte do Patrimônio Mundial?
Se Patrimônios Mundiais já estão pedindo socorro, o que resta aos lugares que não tem esse título? Resta pouco. Também esse mês, foi publicado na PNAS um estudo com pesquisadores da Universidade de Stanford e do México que mapearam a redução de habitat de mais de 27 mil espécies de aves, mamíferos, anfíbios e reptéis e avaliaram os efeitos cascata que as extinções desses grupos irão causar. Segundo os autores, estamos no sexto evento de extinção em massa e o pior depois da extinção dos dinossauros.
Figura 2: Gráfico mostrando a porcentagem das espécies ameaçadas e não ameaçadas em cada grupo. Ceballos et al., 2017.
O que está sendo feito?
Reuniões são feitas, lideres mundiais assinam tratados (ou “DESassinam”), recursos são alocados, pesquisas são feitas e os dados são apresentados, mas o que falta para a destruição acabar? Falta empatia, segundo Gerardo Ceballos, autor do estudo publicado na PNAS citado anteriormente. Ele diz que “a perda massiva de populações e espécies reflete a nossa falta de empatia com todas as espécies selvagens que tem nos acompanhado desde as nossas origens”. Você não precisa ser pesquisador, membro da IUCN, naturalista, ecologista ou estar por dentro de todas as pesquisas da área, mas todos precisamos avaliar nossos hábitos e os impactos que eles causam. Pequenas ações importam. Até quando você não vai se preocupar?


Referências:

www.sciencedaily.com/releases/2017/06/170630105018.htm

http://www.pnas.org/content/early/2017/07/05/1704949114

http://whc.unesco.org/en/conventiontext/

http://whc.unesco.org/?cid=31&l=en&&


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